"Pernas pro Ar", que estreia em São Paulo hoje, de fato injeta bossa num formato que respira rigor e precisão --combinação que é meio caminho para a frieza. A história da entediada dona de casa Helô, que recebe do diabo um ultimato para se reinventar, é contada com as protocolares coreografias, canções, números de sapateado e percussão corporal.
Mas também com entrechos de dramaturgia que remetem ao besteirol e fariam corar os produtores dos ingênuos títulos da Broadway transpostos tal e qual para a cena brasileira.
A questão é o alcance do projeto social associado ao espetáculo. Para por em prática a ideia de "encontrar tribos que não frequentam o teatro", a atriz conta com quatro patrocinadores, que financiam o espetáculo via Lei Rouanet.
A produção não divulga o orçamento, mas se trata de "um empreendimento", como diz Raia, com orquestra ao vivo, 12 bailarinos-cantores-atores em cena, uma tecnologia de projeção inédita no país e uma equipe que soma 50 pessoas.
Até julho do ano que vem, "Pernas" aportará em 17 capitais. Segundo a atriz, ONGs de canto e artes cênicas serão convidadas a assistir a ensaios, e haverá sessões abertas de um making-of do musical. Também estão previstas apresentações gratuitas no pier Mauá, no Rio, e em um hangar de vidro em Belém.
Os ingressos para a minitemporada em São Paulo, entretanto, custam entre R$ 50 e R$ 200. "Tenho ingressos de todos os preços porque preciso sobreviver", afirma Raia.
Pernas, pra que te quero
No enredo do musical, o 1,10 m de pernas de Helô (Raia) rouba o protagonismo da personagem ao criar vida própria e, à revelia da dona, conduzi-la a lugares como um ringue de boxe, um terreiro de macumba e um ônibus lotado. Fora de cena, a atriz reconhece a contribuição delas à sua imagem, mas pondera que "soube aproveitar a beleza como adendo para virar atriz": "Não luto contra isso. É mais uma coisa de que posso brincar.
Quem quiser imaginar que imagine. Mas tampouco quero ser refém dessa imagem." E aproveita para dar sua versão de uma antiga anedota: a de que teria segurado suas pernas por US$ 1 milhão. "Não foi ideia minha, mas de uma seguradora que me patrocinava [no começo dos anos 90]. Jamais faria seguro das minhas pernas."
Veterana em matéria de musicais (estreou no gênero em 86, com "A Chorus Line"), Raia vê três lacunas na produção brasileira contemporânea nesse formato: direção, dramaturgia e composição. "Já temos elenco preparado para manter cinco grandes musicais em cartaz ao mesmo tempo. Também há bons técnicos.Mas ainda faltam diretores e, sobretudo, compositores que escrevam contando histórias.
Acho que o Lenine faria um belo musical. E o Chico [Buarque] tinha de voltar a fazê-los." Vinda de uma sequência de musicais que inclui "O Beijo da Mulher Aranha" (2001) e "Sweet Charity" (2006), a atriz planeja para breve uma incursão pelo "teatro experimental, para 20 pessoas, em que você passa um ano estudando".
Cacá Carvalho, que a dirige aqui e está também à frente da Casa Laboratório, referência no teatro de pesquisa paulistano, poderá mostrar o caminho das pernas.
PERNAS PRO AR
Quando: estreia hoje, às 21h, domingo, às 20h, e dias 10, 11 e 12, às 21hOnde: teatro Bradesco (Bourbon Shopping - r. Turiassu, 2.100, 3º andar, tel. 0/xx/11/3670-4141)Quanto: de R$ 50 a R$ 200Classificação: 14 anos
Fonte: Folha Online
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